sexta-feira, 18 de junho de 2010

Minha ignorância escancarada

- Li poucas linhas de Saramago, admito. Mas preciso dizer que fiquei em estado de choque quando soube da sua morte. Retardatária, só o soube quando cheguei à Redação, pela chamada do jornal na televisão. Sei que bons leitores que se prezam e pessoas consideradas "cultas" devem estar me achando uma das tantas burras da sociedade, que só leem futilidades. Não importa, no momento o que está me tocando é a morte desse magnífico escritor português. Apesar da minha aversão assumida aos nossos colonizadores, me curvo a um dos gênios da literatura portuguesa (ao meu ver). Senti um estranho vazio quando soube de sua morte, percebi que algo estava sendo interrompido. Na verdade, que uma porta estava se fechando, não teremos mais acessos a novas palavras do mestre. Ainda que tenha restado uma obra inédita, inacabada, o que nos resta é nos deliciar com suas obras consagradas, seus longos textos jamais esquecidos. Eu, que sou preconceituosa a pessoas das ciências exatas (não tanto, mas um pouco), admito mais uma vez, que esse mecânico é um gênio. Das letras. Fã assumidas das belas palavras, da boa escrita, da perfeita colocação, do casamento ideal entre acentos, pontos e sílabas, mergulho num lago de tristeza. Estou triste mesmo. Decreto para mim mesma que a partir de agora devo ler todas as linhas dele, cada letra, sílaba, palavra, frase, oração, parágrafo, livros. Enfim, vai em paz, José! Até breve.

Eu luminoso não sou

Eu luminoso não sou. Nem sei que haja
Um poço mais remoto, e habitado
De cegas criaturas, de histórias e assombros.
Se, no fundo poço, que é o mundo
Secreto e intratável das águas interiores,
Uma roda de céu ondulando se alarga,
Digamos que é o mar: como o rápido canto
Ou apenas o eco, desenha no vazio irrespirável
O movimento de asas. O musgo é um silêncio,
E as cobras-d'água dobram rugas no céu,
Enquanto, devagar, as aves se recolhem.

(in PROVAVELMENTE ALEGRIA, Editorial CAMINHO, Lisboa, 1985, 3ª Edição)

Um comentário:

  1. A viagem, sem dúvida, será profunda. As viagens com Saramago são sempre longas. Falam ao nosso eu. E permanecem.

    Bom post.

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